J� fingi que estava doente para faltar � aula e assistir televis�o durante a manh� inteira, pixei muros, quebrei janelas de vizinhos e corri pra de baixo da cama. Dancei em anivers�rios de 15 anos e curti � be�a. Tive v�rias crises de bronquite na inf�ncia, com a mesma freq��ncia com que amei e "desamei" meus amores imagin�rios. Fugi de casa e voltei antes do meu programa favorito come�ar. Dei os nomes para os oito cachorros e os dois papagaios que tive e que ficaram comigo menos de um m�s cada. Cantei durante tardes inteiras as mesmas m�sicas. E senti uma felicidade intensa quando ouvi minha sobrinha pronunciar meu nome pela primeira vez. J� fui mandado para fora da sala sem ter culpa de nada e tendo culpa tamb�m (e essas foram muitas). Tirei nota baixa e levei "bomba". Discuti com minha professora de matem�tica porque achava ela uma chata, mas hoje percebo que eu n�o fui t�o legal quanto pensei que tivesse sido. Eu falei: "tipo assim", "ent�o" e "n�" em cada frase pronunciada. Me apaixonei por minha melhor amiga do parquinho e acho que ela tamb�m se apaixonou por mim e ambos nos apaixonamos pelos personagens do filme Um amor para recordar (foi um barato!). Curti "pakas" Legi�o urbana, chorei com minha turma ouvindo Vento no litoral, Giz e Hoje a noite n�o tem luar e pulei ao som de Vamos fazer um filme, Faroeste caboclo e Eduardo e M�nica. J� quis aprender a tocar viol�o, piano, sax e bateria. J� quis aprender a falar ingl�s, espanhol e alem�o e essa fase ainda n�o passou, mas decidi primeiro rodar um pi�o, soltar uma pipa e encher um pote de bolinhas de gude. Vivi a emo��o de passar no vestibular e a frustra��o de n�o conseguir enfrentar at� o fim a facu. Senti falta da velha escola. Fiz a lista do primeiro dia do ano, aquela das cem coisas que voc� n�o pode deixar de fazer, refleti sobre a vida em meus anivers�rios. J� decidi meu futuro pelo menos umas mil vezes. Tentei mudar, acho at� que melhorei, mas eu sou assim. Escrevi um livro. Plantei uma �rvore. Perdi a chave de casa, perdi amigos, oportunidades, perdi a vontade de tudo! Mas logo em seguida dormi e quando acordei quase tudo pareceu estar no mesmo lugar. Passei noites inteiras navegando na internet e assistindo filmes sem gra�a, daqueles que quando terminam voc� diz: - N�o acredito! Decidi conquistar a garota dos meus sonhos, eram quase quatro da manh�, liguei para dizer que te amo - eu disse - mas acho que ela n�o me ouviu. J� quis fazer uma tatuagem e j� morei sozinho. J� senti aquele frio na barriga. Esperei o telefone tocar. Ca� na gargalhada no �nibus, em reuni�es e em outros lugares muito impr�prios lembrando de situa��es vividas. J� passei pelo mico de estar no cinema com duas amigas e ouvir um monte de "psiu" e "sil�ncio, por favor," eram para elas chorarem mais baixo. Ganhei uma farda, parei com a bola. Ouvi uma m�sica e li uma frase e pensei em algu�m. J� tive um grande amor, e por amor eu sorri, chorei, zanguei, dei o meu melhor, por amor eu abri m�o. E depois tive que come�ar tudo do zero, de novo. Virei um dia no bar, chega fiquei mole, era bebida pra l� e pra c�, mas esse bico de gar�om definitivamente n�o era pra mim. Fiz melhores amigos. Conheci novos lugares, novos estilos musicais, novas maneiras de ver a vida. Arrumei um emprego, abri minha pr�pria empresa e decidi ganhar menos para dar mais as pessoas que est�o ao meu lado. Fiquei triste por descobrir que uma pessoa n�o acreditou em mim, mas tudo bem, eu tamb�m n�o acredito em todo mundo. Tentei aprender a cozinhar e � claro minhas visitas adoram quando eu ligo para pedir pizza ou qualquer coisa que j� venha pronta. Tentei ler um jornal inteiro, mas fiquei entediado. Fui acampar em turma, viajei s�, vi o p�r-do-sol e percebi quanto tempo perdi apenas admirando a lua. Vi uma estrela cadente e consegui fazer um pedido. J� apostei a �ltima ficha e perdi e isso aconteceu mais de uma vez. Me arrependi de coisas que fiz e de tantas outras que eu devia ter feito. Estive em situa��es nas quais agi e me senti um idiota, um burro. Um dia acordei me achando o homem mais lindo do mundo, mas ai olhei no espelho e percebi, que bobagem! N�o tentei muitas coisas por medo de n�o conseguir e j� tentei outras at� demais. A raz�o sempre foi minha �nica esposa at� eu descobrir que a vida � curta demais para casar-se com uma s�. E quase sempre quando vou fazer a limpeza do meu quarto, coisa que eu quase nunca fa�o encontro rascunhos de sonhos e projetos que por um ou outro motivo foram deixados pra tr�s, ent�o com coragem e entusiasmo os levo para minha oficina da realidade. E quando me perguntam se eu passaria por tudo isso de novo, respondo: - N�o desistiria da casa na �rvore.