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O jardineiro e o Beija-flor
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Era uma manh� ensolarada de brisa ainda fresca, a dar bom dia � natureza. O beija-flor, faceiro, dava mais uma de suas voltinhas pela redondeza, atra�do pelo aroma das flores, que cumprimentava com um beijo ligeiro, levando carinho, colhendo alegria.

Neste dia, um lindo jardim avistou, e para l� voou. Flores exuberantes o esperavam, vestida de cores, aveludadas, cheirosas, vistosas, majestosas flores. O pequeno p�ssaro encantou-se e decidiu voltar ali todas as manh�s.

O jardineiro sentado � sombra de uma primavera, observava maravilhado o espet�culo do beija-flor feliz que lhe pareceu encantado e passou a esper�-lo todos os dias, o dia todo. Sua chegada era uma festa, e sua partida a nuvem que escurecia a sua alegria. Decidiu cultivar mais flores, uma mais linda que a outra. E, assim, cada dia mais tempo passava o beija-flor em seu jardim. Quanto mais convivia com aquela ave, mais a achava inigual�vel, especial, am�vel. Com ela aprendia a amar, a rir e chorar, a esperar e a perdoar. Ele estava apaixonado.

Os momentos que seu beija-flor se ausentava, pesava-lhe na alma, e do�a-lhe imaginar que ele pudesse estar visitando outros jardins, beijando outras flores. E passou a ter ci�mes at� das flores que ele j� havia beijado antes mesmo de o ter conhecido. Temia que outros pudessem tir�-lo dele ou que seu beija-flor encontrasse flores mais lindas para beijar. Cego por estes pensamentos, o jardineiro passou a seguir seu beija-flor o tempo todo, furtivamente, sem que seu amor soubesse. E � noite, enquanto todos dormiam, aproveitava para invadir os outros jardins e destru�-los. Aos poucos foi arrancando todas as flores que o beija-flor visitara ou que pudesse visitar naquela localidade.

Sua inseguran�a era tanta, que o jardineiro decidiu mostrar ao beija-flor que nenhum outro jardineiro jamais o amara. Para isso preparou emboscadas aos rivais, disfar�ando-se de lindas e maliciosas pretendentes, arrancando-lhes palavras amargas sobre o pequeno beija-flor. Palavras que ele carregava como um triunfo para provar ao seu amor que ningu�m mais prestava al�m de si pr�prio. Destru�a assim, lentamente, a alegria daquele p�ssaro que passou a sentir-se enganado pelas pessoas e iludido pela beleza e amor que julgara ter possu�do um dia. O jardineiro, sem piedade, dizia-lhe que as flores de outros jardins eram artificiais ou venenosas, e que s� as do seu jardim eram verdadeiras.

Assim, o beija-flor foi ficando preso a estas armadilhas, isolado de seus amigos, antigos jardins, convencido de que at� ent�o vivera apenas ilus�es. O pre�o disso? A sua alegria que se dissipava com as frustra��es que lhe feriam a alma e seu desencanto que aumentava como nuvem de tempestade anunciando f�ria, ofuscando o sol.

Um dia, por�m, o p�ssaro descobriu as artimanhas do jardineiro e revoltado pensou voar para longe, mas n�o tinha muitos lugares pra ir. Acabou perdoando seu "protetor" e ficando por ali mesmo. E isso se repetiu muitas vezes. O beija-flor perdoando seu jardineiro. Mas, o encanto, a admira��o se dissipava a cada decep��o, a cada promessa n�o cumprida do jardineiro. E, aos poucos, a ave desejou libertar-se e come�ou a al�ar v�os mais longe.

O jardineiro, inconformado, julgando-se protetor, o seguia sorrateiramente destruindo tudo o que encontrava, afastando rivais e inimigos imagin�rios, dono de seu beija-flor. At� que um dia o pior aconteceu. Depois de descobrir que era seguido, o beija-flor disse adeus. E o jardineiro num gesto de desespero, tentou agarr�-lo � for�a e quebrou sua asa. Chorando ambos ca�ram por terra.

O beija-flor arrastou-se entre os pedregulhos e espinhos e foi refugiar-se numa toca ali perto, o jardineiro gritava por ele em prantos. Mas desta vez era mesmo o fim.

A cada dia o homem foi vendo seu pequeno tesouro se afastando, arrastando-se para fora do jardim, sem olhar para tr�s, assustado, magoado, ferido. Era agora uma ave triste e sem gra�a. E caiu em pranto de arrependimento.
- O que eu fizera com ela? Onde est� o lindo p�ssaro que me encantou? Eu pensei proteg�-lo e o destru� - Desolado, sentado sob o sol escaldante que ardia menos que seu remorso, olhou ao seu redor por toda a extens�o de seu jardim e o viu como se o avistasse pela primeira vez. Jardim? N�o havia mais jardim algum. Onde antes houvera flores exuberantes e perfumadas agora s� existia ervas daninhas, espinhos e vest�gios de flores secas.

Perdera seu beija-flor, seu grande amor, porque preocupara-se demais com os jardins alheios, perdera tempo demais tentando impedir que sua ave voasse para fora de seu jardim e se esquecera de cultivar suas pr�prias flores, de arrancar as ervas daninhas e queimar os espinhos que agora feriam-lhes os p�s.



L�dia Sirena Vandresen - 12.02.2014


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