Houve um tempo em que as chuvas esqueceram de nos visitar.
As arvores ficaram amareladas, e as flores perderam o vi�o.
N�o se ouvia o canto dos p�ssaros silvestres, e at� os animais dom�sticos demonstravam irrita��o.
Nas colinas, o capim seco ou algum resto de vegeta��o ardia em chamas.
Olhava aquilo sendo devorado pelo fogo e via a tristeza turvar os olhos do meu pai.
O rio doce emagreceu tanto, que se podia contar as suas costelas de pedra, ou apalpar o seu ventre de areia.
As noites eram pesadas, sufocantes e infestadas de mosquitos!
As pessoas buscavam um consolo na f�. Saiam da igreja e formavam a prociss�o. Faziam promessas para convidar a chuva.
Havia o medo coletivo. A cidade implorava a ben��o das aguas.
Era uma prociss�o imensa aos olhos de uma crian�a, e quando escurecia, e acesas eram as velas, a cidade era agraciada com o perfume da carna�ba, do s�bo de carneiro e o cheiro do incenso queimando.
E porque havia pregui�a no vento, nossas noites permaneciam horas perfumadas, num doce misticismo produzido pelos c�nticos, ladainhas, velas e incensos.
O reservat�rio que garantia �gua para a usina de energia quase secou, houve racionamento e a luz s� nos finais de semana.
Os radios emudeceram sem eletricidade, e o silencio nos permitia ouvir uma orquestra de sapos, pererecas e saracuras, que vinha de um brejo � distancia, e acumulava sobras de �gua do chafariz.
Era a natureza desorientada. Eram os sapos implorando chuva!
Mesmo assim, os rapazes iam para suas namoradas, outros para o col�gio onde tinha luz a gerador, outros contar historias.
Para n�s crian�as, havia o espet�culo dos vagalumes com suas luzes de todas as cores, matizando a noite e dando vida � escurid�o.
As mo�as iam para suas cirandas ou pular corda, os meninos iam brincar de "pique", ou correr atraz de um vagalume de cor rara.
Aquelas noites pareciam chuviscadas de pedras preciosas: Turmalinas verdes, top�zios amarelos, safiras azuis e muitos diamantes, refletindo aquela imensidade de cores.
Em �poca alguma ouv� tanta modinha, tanta cantiga de roda, tanto dar-de-m�os, ou tantos sorrisos surpreendidos no rosto dos namorados.
Era a nossa inocencia, e o lirismo dos vagalumes que davam sentido �quelas noites.
Talvez para mostrar que bastava uma rua resplandecida de "lanterninhas", para se extrair daqueles tempos, uma montanha de
felicidade.-
"Aos namorados"
Formata��o: JAS
Joao das Flores