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Admirar uma arte � como admirar uma boa arma: Voc� pode gozar com sua beleza ou o estrago que ela faz.
Antes da produ��o em massa, das pobres m�quinas condenadas � repeti��o e do grande lucro vir, as armas eram literalmente obras de arte. Que tolo negaria que quem tocava t�o gentilmente naquele peda�o de metal distorcido era um artista? A pequena produ��o quase artesanal estampava a responsabilidade de quem a fazia, necessitando ao criador o cuidado de uma m�e com o filho. Voc� pode pesquisar as provas disso, os auto-relevos ao longo de seu corpo como em pinturas, o tambor saliente como se pedisse uma bala e o cabo em madeira, contorcido como um bonsai moyogi. Aquilo era belo e quase justo. A demora da n�o-autom�tica oferecia a possibilidade de uma revida��o entre a recarga de um tiro e outro.
Mas o tempo passa, a Revolu��o tarda mas n�o falha.
Est� escrito em nossos c�digos gen�ticos: A produ��o em s�rie � o destino da humanidade. As c�lulas prolet�rias seguem a linha de produ��o prot�ica para n�s, pequenos burgueses, usufruirmos de nossas c�pias de carbono. Nessa �poca, a linha de produ��o das armas tinha seu pedido: Fuma�a, fuma�a podre aos montes, deslizando lentamente pelas chamin�s de suas f�bricas como num french inhale. Seja do sul escravocrata ou do norte industrializado, as regras s�o as mesmas: A guerra se alimenta de corpos. Vida n�o traz lucro. Entre os intervalos do expediente, os funcion�rios diziam que nada acontece sem que Deus queira, e sob essa ben��o, banhando como ouro o corpo da gan�ncia, dos c�us, a tecnologia descia. Voc� ficaria impressionado com o quanto ser - humano pode evoluir ao saber o lucro disso.
Corpos frios aquecem o mercado e fazem a ind�stria acelerar. � quase poesia. Esque�a os jovens de vinte anos na linha de frente sangrando um litro num po�o de merda e levando tiros lentamente pensando lutar por seu pa�s. Isso n�o existe. Estamos na era das autom�ticas, quem ainda leva tiros lentamente? Somos do futuro, com um minuto livre e boa mira, voc� pode ter seu pr�prio genoc�dio.
E, veja, minha boca seca e meus dentes trincam quando penso nisso. Pronuncie com aten��o e perceba o poder como seus l�bios e l�ngua interagem ao saborear essas palavras.
Eu quero ter meu pr�prio genoc�dio.
Eu quero ver id�ias e sentimentos caindo em s�rie pelo ch�o, como corpos na Segunda Guerra Mundial ou em um massacre �tnico na �frica. Quero fazer Hiroshima parecer um acidente e o holocausto parecer a Disneyl�ndia. Eu quero ver o napalm da minha palavra queimar sua filosofia dolorosamente e, rindo, te observar chorando pela a morte de algo dentro de voc�, seja a tristeza ou a esperan�a. Preste aten��o e olhe nos meus olhos, n�o perca o foco porque eu estou prestes a cometer o meu primeiro homic�dio doloso. A bala que voc� espera que eu coloque j� est� no tambor desde que eu comecei a falar contigo, e voc� pode ouv�-la. Sinta a sua esquizofrenia correndo pelas suas sinapses. A voz que l� esse texto em sua cabe�a � a bala do tiro que atravessa sua mente. E esse foi o momento do tiro. Agora que te avisei, voc� pode sent�-la, lentamente dissolvendo seus conceitos, silibicamente matando sua id�ia absorvida, perfurando um �rg�o vital: N�o existe a admira��o da beleza de uma arte.
A arte � como uma arma:
N�o importa o quanto voc� queira admirar sua beleza, ela foi feita para assassinar.
Existe um ditado popular na Am�rica o qual diz �Deus criou os homens, mas a Colt os tornou iguais�. Na minha vers�o, gosto de pensar que �Deus criou os homens, mas a arte os tornou iguais�. �Iguais em qu�?�, voc� deve se perguntar. Igualmente vulner�veis � ado��o e assassinato de concep��es, alguns sendo t�o sutis que voc� n�o perceber� e viver� como se nada tivesse ocorrido. Agora, por exemplo, um dos dois acontecer�. Em dez segundos parte de sua mente mudar� para sempre e voc� nem ao menos ir� perceber. Como em uma cirurgia com anestesia. �A voz que l� esse texto em sua cabe�a � a bala do tiro que atravessa sua mente�. Como se nada houvesse acontecido. �A voz que l� esse texto em sua cabe�a � a bala do tiro que atravessa sua mente�. Como se nada tivesse acontecido. �A voz que l� esse texto em sua cabe�a � a bala do tiro que atravessa sua mente� Como em uma cirurgia com anestesia. �A voz que l� esse texto em sua cabe�a � a bala que acaba de desaparecer�.

� Como se nada tivesse acontecido, Kalil Fagundes.


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