Vendaval
� vento do norte, t�o fundo e t�o frio,
N�o achas, soprando por tanta solid�o,
Deserto, penhasco, coval mais vazio
Que o meu cora��o!
Ind�mita praia, que a raiva do oceano
Faz louco lugar, caverna sem fim,
N�o s�o t�o deixados do alegre e do humano
Como a alma que h� em mim!
Mas dura plan�cie, praia atra em fereza,
S� t�m a tristeza que a gente lhes v�
E nisto que em mim � v�cuo e tristeza
� o visto o que v�.
Ah, m�goa de ter consci�ncia da vida!
Tu, vento do norte, teimoso, iracundo,
Que rasgas os robles � teu pulso divida
Minh'alma do mundo!
Ah, se, como levas as folhas e a areia,
A alma que tenho pudesses levar -
Fosse pr'onde fosse, pra longe da id�ia
De eu ter que pensar!
Abismo da noite, da chuva, do vento,
Mar torvo do caos que parece volver -
Porque � que n�o entras no meu penssamento
Para ele morrer?
Horror de ser sempre com vida a consci�ncia!
Horror de sentir a alma sempre a pensar!
Arranca-me, � vento; do ch�o da exist�ncia,
De ser um lugar!
E, pela alta noite que fazes mais'scura,
Pelo caos furioso que crias no mundo,
Dissolve em areia esta minha amargura,
Meu t�dio profundo.
E contra as vidra�as dos que h� que t�m lares,
Telhados daqueles que t�m raz�o,
Atira, j� p�ria desfeito dos ares,
O meu cora��o!
Meu cora��o triste, meu cora��o ermo,
Tornado a subst�ncia dispersa e negada
Do vento sem forma, da noite sem termo,
Do abismo e do nada!
� Fernando Pessoa
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