Qual � a Origem da Amizade?


Venho ensaiando escrever sobre a amizade h� pelo menos vinte anos, sem coragem de dar seguimento a esse antigo projeto. Percebi que se trata da mais bem-sucedida forma de intera��o entre as pessoas, de uma fonte de prazeres e alegrias enormes e geradora de tens�es e elementos negativos m�nimos.

A primeira quest�o � e, talvez, a mais importante � est� relacionada � seguinte d�vida: seria a amizade uma vers�o adulta e sofisticada do amor, ou um fen�meno inteiramente diferente?

Como regra, achamos interessantes aquelas pessoas que desenvolvem maneiras de ser e de racionar sobre todos os assuntos similares �s nossas em muitos aspectos. N�o s� achamos gra�a como nos sentimos muito pr�ximos delas. Aqui, a sensa��o de integra��o n�o se origina de um processo f�sico, como acontece no amor � ou mesmo na integra��o com a p�tria ou com o universo. Ela deriva de uma intimidade intelectual, de afinidades na maneira de pensar e de sentir a vida.

Nas amizades, a ponte que permite que duas criaturas individuais e solit�rias se sintam integradas surge gra�as � facilidade com que elas se comunicam. � extraordin�rio o prazer que sentimos quando temos a impress�o de que aquilo que o outro est� entendendo corresponde exatamente ao que estamos dizendo. Temos a impress�o de n�o estarmos s�s neste mundo. O prazer que experimentamos ao conversar com nossos amigos � definidos assim de modo rigoroso, sem nada a ver com os diversos conhecidos que temos � � enorme; n�o raramente maior do que o que sentimos ao conversar com nossos parentes e com o nosso objeto de amor que, como disse, corresponde a uma escolha mais relacionada com outros processos.

Como as amizades referem-se a processos essencialmente adultos, n�o s�o contaminadas, a n�o ser de modo muito superficial, pelas penosas emo��es possessivas e ciumentas. Podemos ter mais de um amigo �ntimo. Gostar de um n�o significa deixar de gostar do outro. O respeito pelos direitos individuais e pelo modo de ser do amigo � a t�nica. A inveja, quando existe, est� sob controle, pois, mais do que tudo, queremos que nossos amigos prosperem; n�o tememos que isso nos afaste deles, como costuma acontecer nas rela��es amorosas, em que o progresso do amado � sempre uma enorme amea�a � estabilidade da rela��o.

A amizade � fen�meno essencialmente intelectual. Pode perfeitamente existir entre pessoas que n�o tenham interesse sexual um pelo outro. Ela � at� mesmo mais comum entre pessoas do mesmo sexo, em que as afinidades mentais, talvez, sejam mais comuns. Agora, por puro preconceito, mesmo nos tempos atuais, em que o erotismo tende a se expressar de modo mais livre, n�o pensamos em intimidades sexuais entre amigos. Da mesma forma, � f�cil imaginar que as rela��es que se iniciam como amizade podem evoluir para um namoro ou mesmo para um casamento. A id�ia de que o amor � coisa muito mais rica do que a amizade �, a meu ver, antiga. Afinidades intelectuais e semelhan�as de gostos e interesses ter�o de ser parte essencial de todos os relacionamentos mais �ntimos.


Autor Desconhecido