SEM IGUAL {...}
Hoje é o primeiro dia do resto de nossas vidas.
Tente achar uma canção que não seja relevante, revolucionária e irreverente de Rita Lee. Ela jamais errou em 60 anos de carreira. Era uma antena da liberdade.
Quem não levantou as mãos para cima, mexeu a cintura, saiu do lugar, espantou a pasmaceira com Agora só falta você, Chega mais, Doce Vampiro, Lança perfume e Baila comigo?
Nunca mais entrei num cinema, por exemplo, sem lembrar de sua letra.
“No escurinho do cinema
Chupando Drops de anis.”
Ela lia as nossas emoções, brincava com as nossas expectativas, antecipava os nossos pensamentos. Atuava como uma telepata nos guiando para o futuro.
Suas músicas contam histórias, há uma narrativa que nos ajuda a entender o nosso lugar no amor ou no destino, a aceitar a solidão da escolha, a coragem da diferença.
Foi ela que retirou o estigma de ócio dos artistas, removeu o rótulo de louco da cara dos intensos, apagou a linha reta das mãos dos viajantes. Quantos jovens de diferentes gerações não partiram com uma mochila nas costas, a enfrentar o mundo, cantando para si mesmos “Você é a ovelha negra da família/ Agora é hora de você assumir”?
É justamente a ovelha negra que nos salvou do rebanho. Puxou pessoas entaladas em armários, salvou vocações atoladas no tédio dos escritórios.
O melhor de Rita Lee teria que vir com mais de cem hits. Só tem clássicos.
Cabelos pintados ou naturais, cara limpa ou maquiada, ela é a maior roqueira que existiu no país. Deveria ser concedida a imortalidade a algumas exceções da nossa condição, quando um talento muda definitivamente o comportamento e a cultura muito além dos modismos.
Simplesmente não confie que ela faleceu em uma segunda-feira (dia 8 de Maio/2023), aos 75 anos. O fim é uma formalidade totalmente dispensável para aquela que teve um pacto apaixonado com a metamorfose.
Nunca teve imitadores. Jamais alguém ousaria parodiá-la. Ela é o nosso Elvis sem sósias. Nosso único espécime da passionalidade.
Baby baby, não há como cansar de chamar Rita Lee de volta ao palco, porque jamais estaremos perdidos depois dela. Eu acredito no bis. Gente assim retorna de um jeito ou de outro.